LOVE (França, 2015)

Por Leandro Lages, em CINEMA

LOVE (França, 2015)

09 de Novembro de 2015 às 20:33

Ira, inveja, preguiça, soberba, avareza, luxúria e gula. Eis os sete pecados capitais.

O megainvestidor Warren Buffet certa vez disse que “dos sete pecados capitais, a inveja é o mais idiota, porque não faz você se sentir melhor. Você se sente pior. Tive bons momentos com a gula... e nem vamos falar na luxúria”.Falemos, sim, caro Buffet, da LUXÚRIA.

LOVE, do polêmico diretor Gaspar Noé, é luxúria em estado natural, sem os artificialismos e a plasticidade exagerada e vulgar dos filmes eróticos. E com um atrativo interessante: pode ser assistido em 3D conferindo mais realismo às cenas de sexo.

O filme inicia com o protagonista Murphy, casado, recebendo a ligação da mãe da sua ex-namorada preocupada com o desaparecimento da filha.

A partir daí o filme se alterna em épocas diferentes: a atual e modorrenta vida de casado com a esposa e as lembranças dos tempos de solteiro com a ex-namorada, repleta de paixões e sexo sem limites.

A maioria dos filmes românticos aborda o amor sob a ótica das grandes paixões inserindo cenas sutis de sexo. Loveinverte esse padrão ao destacar o amor sobre a perspectiva explícita do sexo, a paixão é mera coadjuvante.

As cenas focam naturalmente as partes íntimas dos atores, bem com o sexo nas suas mais variadas modalidades. E o sexo ocorre de verdade, em closes próximos, internos e ginecológicos.

Isso tornou difícil a escolha dos atores, todos desconhecidos e em busca de notoriedade. Muitos recusaram o papel ao saber que deveriam praticar sexo de verdade. Por este motivo as atuações são fracas e o enredo um pouco abaixo da média, por vezes piegas. A grande atração é a ousadia do filme.

Méritos para o diretor Gaspar Noé, que já havia mostrado suas cartas no excepcional Enter the Void (França, 2009), trazendo uma inovadora perspectiva no posicionamento das câmeras. Enter the Void se passa a partir dos olhos do espírito de um viciado em drogas acompanhando o desfecho dos acontecimentos após o seu assassinato.

Em ambos os filmes Gaspar Noé brinca com as sensações. Em Enter the Void, as sensações lisérgicas das drogas; em Love, o prazer sexual. A trilha sonora potencializa as sensações visuais e auditivas. A cena ao som de “Is there anybody out there”, do Pink Floyd, é um exemplo disso.

Outros filmes também abordaram o sexo através de uma perspectiva desnuda, tais como Lúcia e o Sexo (Espanha, 2001) e Ninfomaníaca (Dinamarca, 2014), de Lars Von Trier, ambos bem superiores a Love e obrigatórios para os amantes do gênero.

E como o tema é sexo, cabe associar o filme ao estilo visionário do escritor Allan Moore. Na obra Lost Girls ele imagina um diálogo entre três velhas senhoras conhecidas da literatura infantil: Wendy (Peter Pan), Alice (Alice no País das Maravilhas) e Dorothy (O Mágico de Oz).

Extrapolando a visão infantil, Moore explica ao leitor, na licença poética que a literatura nos permite, o que de fato ocorreu com cada uma delas. Já adultas, explicam o que aconteceu a cada uma enquanto adolescentes.

O furacão que levou Dorothy em O Mágico de Oz representou o seu primeiro orgasmo durante uma masturbação na adolescência, experiência que a partir de então a colocou a percorrer uma estrada de tijolos dourados de descobertas sexuais.

Wendy (Peter Pan) descobriu o sexo com garotos de rua que brincavam na floresta de um parque, local que para eles estava à margem da cidade em que viviam, lá era a fantasiosa Terra do Nunca.

Alice revelou ter sofrido abusos sexuais por parte de um amigo do seu pai, que enquanto praticada os atos libidinosos olhava sempre para o relógio para conferir o horário que o seu pai chegaria. Era rápido como um coelho.

Com LOVE, o diretor Gaspar Noé une-se a Lars Von Trier (Ninfomaníaca) e Allan Moore (Lost Girls) no rol de visionários que rasgaram as vestes do sexo e apresentaram a luxúria como um pecado capital cujo preço vale a pena ser pago. Pelo menos na visão dos protagonistas das obras!

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