Os Oito Odiados (Estados Unidos, 2015)

Por Raul Lopes, em CINEMA

Os Oito Odiados (Estados Unidos, 2015)

13 de Janeiro de 2016 às 21:37

A vida imita a arte. Célebre frase usada para os casos em que uma obra de arte, seja de que natureza for, consegue prever acontecimentos reais e antecipar fatos da vida cotidiana, mas existem casos em que uma obra de arte, ainda inacabada, consegue produzir efeitos no mundo real. Neste caso estamos diante de uma anunciação, ou até mesmo coincidência... Os Oito Odiados, o novo filme de Quentin Tarantino reflete bem a segunda situação.

Partindo de um período pouco posterior ao fim da guerra civil americana entre os Yankees (norte) e os Confederados (sul), o filme retrata um ranço impregnado na civilização americana com relação a cor da pele e a pena (morte) imposta pelo Estado como senso de justiça. O racismo é uma temática abordada no filme, os Confederados (do sul) defendiam a escravidão, e pelo que parece até hoje, é só observar recentes acontecimentos de intolerância racial nos Estados Unidos.

Durante as gravações do filme, antes mesmo ‘da vida imitar a arte’, alguns episódios de racismo chocaram os EUA. Um deles ocorreu em agosto de 2014 com a morte de Michael Brown, jovem negro de 18 anos, por disparos de um policial branco em Ferguson, e o outro, o assassinato de nove membros de uma comunidade religiosa afro-americana no último mês de junho em Charleston, por um “supremacista” branco.

A tensão racial não ficou presa à época do filme, até hoje a veia sulista-confederada ainda pulsa no corpo americano. Atos ligados ao racismo e o estampar da ‘bandeira confederada’ em solo americano (foto) são recorrentes ao ponto do próprio diretor afirmar: "De repente as pessoas começaram a falar da confederação americana de um modo inédito. Eu sempre considerei a bandeira rebelde como uma suástica americana, e de repente as pessoas estavam falando disso, e agora a estão proibindo". Em recente declaração, o presidente americano Barak Obama, defende que a bandeira confederada deve resumir sua utilidade a um museu.

Bandeira confederada é vista na sede do governo do estado da Carolina do Sul (Foto: REUTERS/Chris Keane/files)

A outra temática é apresentada num ótimo diálogo da primeira metade do filme e nos deixa a pensar sobre a diferença da justiça feita pelo carrasco e a praticada pelas mãos de outro que não seja o Estado. O carrasco mata (enforca) um condenado com o aval do Estado diante de uma plateia ávida pela morte daquele execrável, mas nenhum deles consegue perceber que suas mãos também estão banhadas com o sangue do condenado. A questão é: seria diferente se esse condenado, ao invés de enforcado “pelo Estado”, fosse linchado por todos aqueles que ali estavam presente para assistir sua morte? Seria isso uma injustiça? Veja que estamos diante dos mesmos atores e com o mesmo fim.

Quatro dos oito odiados seguem numa diligência até a cidade de Red Rock, dentre eles: dois caçadores de recompensas (John Ruth e Marquis Warren), uma prisioneira (Daisy Domergue) e um renegado que se diz o novo xerife da cidade destino (Chris Mannix).

Ao serem atingidos por uma forte nevasca, são obrigados a parar num armarinho/abrigo na montanha e lá encontram os outros quatro odiados: um veterano de guerra (Sandy Smithers), um cowboy silencioso (Joe Cage), o carrasco da cidade (Oswald Mobray) e um mexicano que administra a hospedaria (Bob). A partir daí, assim como em Cães de Aluguel (EUA, 1992), será muito papo, bala e sangue.

Não há como não perceber, durante todo o filme, a previsível estética “Tarantiana”. Um tipo pode até argumentar: “mas é claro, estamos diante de um filme de Tarantino, você queria o que?” - Sim! Concordo, mas autoplágio não dá.

A estética previsível não é pela duração do filme, ou pela exagerada falação, ou pela exposição de sangue e violência, ou pela presença de atores de outras produções do diretor (Jean-Pierre Léaud trabalhou em sete filmes com Truffaut e Toshiro Mifune em dezesseis de Kurosawa), mas sim, por colocá-la (a estética) em primeiro plano no intuito de tapear falhas e uma perceptível falta de ritmo do roteiro com direito utilização de um trecho narrado para colocar novamente nos trilhos a história que estava se perdendo, e para piorar, na reta final do filme.

Com Samuel L. Jackson exagerado, o filme é salvo pelas atuações Kurt Russel e Bruce Dern (Nebraska/2013 - http://goo.gl/ZOuBwN) que protagoniza a melhor passagem do filme.

Tarantino usou o velho Ctrl+C Ctrl+V para Os Oito Odiados e caso não tivesse visto sua assinatura, poderia jurar que alguém tentou imitá-lo. Como o diretor anda afirmando que esse é seu penúltimo longa, espero que no último ele feche com chave de ouro.

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