11 de Julho de 2020 às 04:35
Senti o fio da navalha na ponta do indicador direito. O filete vermelho que escorreu dava conta da afiação sensível do instrumento.
O espelho refletia a sujeira do banheiro, do quarto, do meu rosto. A poeira, as baratas, o lodo, as fezes no sanitário, o óleo em minha pele. Respirei uma vez mais, encostei a navalha no pescoço.
Matei-me.
Devagar.
Passo a passo, pelo a pelo.
A barba caia no saco plástico aberto sobre a pia, pra não entupir o ralo.
No fim, olhei pra tudo. Lembrei-me de muitos anos atrás, quando era negra e volumosa. Agora, grisalha, (pré)histórica.
Depois, ao fim, vi-me (o novo). Os vincos entre o nariz, a papada, o semblante. (Quando foi que aconteceu?).
Decidi, eu o novo, que já era hora de tomar uma cerveja.
E lá eu fui, de cara dura e papada mole.
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