Las Acacias (Argentina, 2011)

Por Raul Lopes, em CINEMA

Las Acacias (Argentina, 2011)

30 de Abril de 2014 às 21:29

“Solidão é lava, que cobre tudo, amargura em minha boca, sorri seus dentes de chumbo”

Paulinho da Viola

Las Acacias é uma primorosa produção do cinema argentino que explora a história de um motorista de caminhão que transporta madeira (Acacias – por isso o nome do filme) de Assunção no Paraguai para Buenos Aires na Argentina. A pedido de seu chefe, o protagonista terá que dar carona a uma mulher e seu bebê, com isso será forçado a dividir a cabine do seu caminhão ao longo de 1.500 km entre os países.

O diretor é o estreante Pablo Giorgelli que arrebatou uma dezena de prêmios com Las Acacias e em especial o Caméra d'Or no festival de Cannes, prêmio atribuído ao melhor filme de estreia em todas as competições. Segundo o diretor a escolha dos atores foi bastante lenta e acabou mesclando muito bem a experiência a inexperiência (não no sentido pejorativo). Rubén (Germán da Silva) é um experiente ator do teatro argentino e Jacinta (Hebe Duarte) é uma estreante que nunca havia atuado. Essas diferencias foram muito bem distribuídas pelo diretor na montagem de cada personagem.

O protagonista é um solitário convicto, aposta na solidão como sua fortaleza, vive como caminhoneiro no silencio da estrada. Sobre a solidão, tema muito explorado por filósofos, nos remete imediatamente a figura de Zaratustra de Nietzche (Assim falou Zaratustra). Nesta obra, Zaratustra aos trinta anos de idade ― adulto, porém ainda jovem ― se retira de sua cidade natal e se torna um eremita, morando em uma caverna, no alto de uma montanha, na floresta como condição necessária para o engrandecimento do próprio espírito. Contudo, passado algum tempo, sentiu Zaratustra a necessidade de voltar a se relacionar com os homens para doar aquilo que havia aprendido e acumulado por este tempo todo.

Sob a mesma ótica, o filósofo americano Henry Thoreau afirmou que "Caminhar sem rumo é uma grande arte". A caminhada afasta de si o que não é vida. Mas esse processo não é simples como bem demostra o protagonista de Las Acacias.

O filme apresenta três personagens, Rubém, Jacinta e seu bebê a pequena Anahí (Nayra Calle Mamani). Logo no inicio do filme Jacinta e sua filha se apresentam como uma ameaça a fortaleza solitária e intima de Rubén, mas diante do ótimo roteiro o diretor inicia a desconstrução da personalidade de Rubén com pequenas e preciosas atitudes durante a viagem.

Trata-se de um filme com poucos diálogos, curto, porem lento. A expectativa no inicio da viagem para os primeiros contatos entre Rubén e Jacinta nos deixam dúvidas se uma hora isso realmente vai acontecer. É a verdadeira tensão entre o limite da solidão e a comunicação.

Rubén é arredio, Jacinta uma pessoa sofrida que carrega uma criança de colo e parte a procura de emprego na Argentina. Jacinta o respeita e de forma muito inteligente deixa que ele apresente suas fragilidades e quando isso acontece, Rubén se ampara até mesmo na figura de Anahí.

Como o roteiro é baseado no formato de road movie (metáfora ao percurso da vida), não há como não lembrar de Cinema, Aspirinas e Urubus (BRA, 2005), do também diretor estreante Marcelo Gomes. Las Acacias possui um "sotaque" e o estilo argentino, claro que imputar juízo de valor entre essas duas produções do cinema latino é um erro, aqui quem ganha é o espectador.

Las acacias é um filme global, Cinema, Aspirinas e Urubus tem um apelo regional, mas isso não é o que os diferenciam, pois como bem me disse um grande amigo parafraseando Leon Tolstoi: “Se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia."

O filme não possui como foco central o desemprego ou até mesmo a crise econômica no cone sul, isso se detém apenas ao enredo, o mote utilizado pelo diretor é a criação de um filme sobre questões humanas, sobre a alma das pessoas. O que fica da obra é que o silencio não fala, grita! e a solidão que constrói também fragiliza.

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