Nebraska (Estados Unidos, 2013)

Por Raul Lopes, em CINEMA

Nebraska (Estados Unidos, 2013)

16 de Abril de 2014 às 21:06

Não é um filme sobre velhos, talvez sobre velhice. Mesmo assim, seria pouco para rotular esse sensível filme de Alexander Payne. Nebraska não difere de outros filmes do diretor, como Confissões sobre Schmidt (EUA, 2002) e Os descendentes (EUA, 2011), em todos eles, o adultério, as relações familiares e a visão decadente do American way of life estão presentes.

Como de costume nas obras de Payne, as relação familiares são o fio condutor de todo roteiro. No caso de Nebraska (EUA, 2013), as relações mais intensas pertencem ao universo masculino, entre pai e filho. De acordo com as palavras do próprio diretor: "Recebi o roteiro há nove anos e me apaixonei por essa história ao mesmo tempo engraçada e melancólica". A melancolia está presente desde a bela trilha sonora de Mark Orton até a fotografia monocromática numa feliz escolha de Payne.

Woody Grant (Bruce Dern) é um idoso com sinais de desatino que recebe um panfleto de propaganda pelos correios que acredita ser um bilhete de um prêmio de um milhão de dólares. A partir daí, Woody decide retirar o suposto prêmio na cidade de Lincon no Estado americano de Nebraska. Após várias tentativas frustradas de ir de Billings (Montana) até Lincon (Nebraska) a pé, seu filho mais novo, David (Will Forte), decide levá-lo de carro pelo coração da América para retirada do prêmio. Neste ponto, nota-se um pequena similaridade com História Real (EUA, 1999), de David Lynch, em que o velho Alvim decide fazer uma viagem pelos Estados Unidos em cima de seu cortador de grama.

A partir desse momento, o filme se torna um road movie e a viagem que deveria ser rápida acaba sofrendo alguns contratempos que os obrigam a passar por Hawthorne, cidade em que Woody nasceu e cresceu. Em contato com os moradores, David (o filho) passa a conhecer um pouco mais sobre a personalidade de seu pai. Logo, a viagem ganha a presença de seu irmão mais velho Ross Grant (Bob Odenkirk) e sua mãe Kate Grant, interpretada pela atriz June Squibb, que mesmo como coadjuvante, garante uma brilhante atuação.

A estadia da família Grant em sua cidade natal vai bem até que as coisas começam a sair do controle. Woody vira a celebridade da cidade, pois todos realmente acreditam que ele vai se tornar um milionário. Ao tempo em que David descobre a história do pai, os parentes e “amigos” começam a se aproveitar da bondade de Woody criando situações para usurpar parte de seu “prêmio”. Como bem define a Sra. Grant: “os abutres apareceram antes mesmo da pessoa morrer”.

Woody é um homem ingênuo que acredita nas pessoas, por isso frágil e presa fácil para aqueles que, guiados pelo consumismo, não medem esforços para atacá-lo. O pano de fundo de Nebraska retrata as consequências da recessão econômica na vida do cidadão americano. Neste contexto, os laços de amizade são esquecidos pelo tédio.

Desde o início do filme pode-se perceber claramente a apatia dos personagens. Em Hawthorne o tempo parece não ter passado, o ócio dá lugar ao rancor e os segredos de família começam a ser revelados. Durante todo o filme as mulheres representam personagens mais fortes do que os homens que, na maioria das vezes, são perdedores sem qualquer perspectiva.

O que Woody deseja com um milhão de dólares ? O que ele pretende comprar ? De que forma Woody quer passar o pouco tempo que lhe resta de vida ?

A atuação de Bruce Dern (Woody Grant) é digna de qualquer prêmio. Payne não deixa o filme cair na enfadonha discussão familiar e, invariavelmente, apresenta traços de humor, que não é negro, mas amargo pela carga dramática que possui o filme. De sensível a melancólico, Nabraska é uma fotografia do declínio das relações sociais frente ao tédio e o prazer do consumo. E, mesmo assim, tem um final feliz.

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