Silêncio (EUA, 2017)

Por Leandro Lages, em CINEMA

Silêncio (EUA, 2017)

23 de Junho de 2018 às 14:05

“Faz mais barulho uma árvore que cai do que uma floresta que cresce”. Essa era uma das inúmeras frases que constavam no rodapé da apostila de química do padre jesuíta Florêncio Lecchi.

Não deixa de ser estranho imaginar um padre cientista. Mais estranho ainda saber que esse padre existiu e aportou no Piaui em 1963, vindo da Itália. Seria mais cômodo exercer o ofício religioso na Europa, celebrando missas e orando em mosteiros silenciosos.

Muitos jesuítas não pensavam assim. E partiam rumo a locais inóspitos a fim de, segundo suas concepções, levar a luz a ambientes trevosos. Florêncio Lecchi deixou a família, o emprego, amigos e a terra natal para cumprir a sua missão em um dos mais pobres e sofridos Estados brasileiros.

Sua história rendeu a obra “Florêncio Lecchi – A Vida de um Jesuíta”, de autoria de Gustavo Said e Fernando Macêdo, ex-alunos que realizaram uma extensa pesquisa na Itália e nos arquivos do colégio jesuíta em que o padre lecionava, o Diocesano.

Na obra há o relato da sua vida na Itália, desde a infância até o momento em que decidiu seguir a vocação religiosa, passando pela juventude, estudos, família, amores e a paixão pela química.

Também relata as dificuldades iniciais ao chegar à capital piauiense. Afora passagens curiosas, como o episódio em que reuniu alguns alunos nas férias e partiu dirigindo uma Kombi até Foz do Iguaçu. E também a sua reação quando um usuário de drogas cuspiu a hóstia logo após a comunhão.

Tudo no padre chamava a atenção dos alunos: a extensa barba branca, o forte sotaque italiano, a rigidez educacional, as lições de vida em sala de aula ou na missa e o temor reverencial que todos sentiam, mas, ao final, o idolatravam.

A vida dos jesuítas também inspirou o diretor Martin Scorcese a filmar “Silêncio”. O filme se passa no século XVII e trata de dois jesuítas que partem da Europa rumo ao Japão em busca de seu mentor que sumira. O catolicismo havia sido banido no Japão e qualquer religião não oficial era duramente repelida.

Ao chegarem no país os dois padres iniciam as suas buscas. Também iniciam a catequese em um vilarejo até que são descobertos pelo governo japonês. Nesse momento a carga dramática do filme se intensifica, ressaltando a perseverança dos jesuítas que mesmo diante das mais duras provações (quase) nunca abandonam a sua fé inabalável.

O filme ensina que o silêncio pode ser uma forma de resistência e de sofrimento estoico ante convicções firmadas. Ou ainda que em silêncio há muito a ser dito e ensinado.

Seja no Japão, em um fictício enredo sobre os Jesuítas, ou no Piauí, na verdadeira história de um padre jesuíta cientista, pode-se aprender que, em silêncio, toda uma floresta cresce e permanece firme com raízes muito profundas.

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